Começo esse texto com incerteza do que eu vou dizer até terminar, porém pedindo desculpas a nossos leitores pela ausência em novembro. A vida não esteve fácil e tampouco nós colaboradores estivemos com muitas pautas ou motivações para escrever. Às vezes eu sinto como se estivesse escrevendo mais do mesmo, por mais que tente inovar e fazer diferente.
Mas acho que esse é o mal que todos que se propõem a escrever algo passam em algum momento da vida. Realmente pedimos desculpas por tê-los abandonado nesse mês. E esse foi um mês que tivemos muito mais acesso do que imaginávamos, mesmo sem posts. Talvez isso queira dizer que vocês realmente preferem os posts antigos, mas nós daremos mais posts novos para vocês até que se enjoem. Agora vamos ao que realmente importa (ou não).
A SIM SP fez um evento excelente durante os dias 05, 06 e 07/12. A melhor edição que eu fui até agora, afirmo isso mesmo tendo comparecido em apenas 2 festivais diferentes na noite de sexta feira. Só esses 2 já me fizeram ter certeza isso. 06/12 vai ficar marcado na minha memória.
Especialmente porque minha esperança na música foi renovada pela milésima vez, mas de uma maneira diferente. Já bati muito nessa tecla, mas vou insistir: se identificar com quem está no palco realmente fazem a diferença. Não que seja só isso, mas acho que esse foi o que faltava para que eu ficasse motivada novamente.
Destaco aqui os shows que me emocionaram: terraplana e Land of Talk.
terraplana
Fazia algum tempo que eu não via terraplana ao vivo. Pouco mais de 1 ano pra ser exata e acho que eles não poderiam ter voltado para SP em um momento melhor. Em uma casa de shows nova (pelo menos pra mim) e com um novo guitarrista. A banda realmente se superou e me surpreendeu.
As músicas novas são tão boas que eu gostaria que o álbum fosse lançado hoje mesmo, aliás queria ele aqui na minha mesa agora se fosse possível. Eu não sei quando ele vem, mas eu estou numa tremenda expectativa para ouvi-lo. Eu sei que eu sou muito tiete das coisas e que depois do meu post falando que ela poderia salvar o shoegaze nacional, extremamente fangirl e que ninguém pode me levar a sério, mas a verdade é que vocês precisam conhecer terraplana.
O nome é engraçado, para alguns até absurdo, e faz torcer o nariz. Porém se eles quisessem me vender a teoria de que a Terra é plana, era bem possível que eu comprasse. Mas como eu tenho um bacharelado em exatas, eu jamais admitiria.
O Kevin Shields brasileiro e a mistura da Bilinda Butcher com a Debbie Googe tem o poder de realmente salvar o shoegaze (mesmo que neste momento esteja tudo bem com ele e ele não precise realmente ser salvo, mas é sempre bom ficar esperto porque uma hora podemos precisar). As mudanças na banda, as novas composições e o novo guitarrista (Cassiano Vidal) trouxeram um novo ânimo para a banda.
Outra coisa que achei muito bonita e admirável foi a presença feminina em peso na plateia do show. A linha de frente, eu inclusa, estava repleta de garotas. Geralmente nos shows que eu compareço, é quase sempre forte a presença masculina dominante entre o público.
O show anterior teve mosh, e no show da terraplana tivemos garotas à frente. E o que faz isso acontecer? A banda não tem letras com temáticas feministas, mas tem entre seus integrantes uma moça extremamente talentosa, a Stephani Heuczuk. E ela não precisa dizer nada, só pelo fato de estar ali, já nos provoca identificação e admiração.
Só por ela estar ali, sentimos que também podemos estar. Eu já disse o quanto as referências de mulheres na música são importantes né? Pode começar a observar isso e você vai notar que talvez eu realmente esteja certa.
Ver uma mulher no palco é sempre reconfortante. É aquela novidade que faz as coisas se tornarem mais interessantes, aquele sopro de esperança. Fora que cada vez mais temos musicistas excelentes vindo à tona. A Fender fez um estudo nos Estados Unidos e Reino Unido mostrando que 50% dos novos aspirantes a guitarristas são mulheres.
É importante dar esse tipo de reconhecimento, plataforma e visibilidade para as musicistas, porque ainda a maior parte das listas de melhores guitarristas/bateristas/baixistas e etc são formadas por homens. Só homens são reconhecidos por seus talentos musicais. E caramba, ver uma mulher tocando bem um instrumento me dá muita vontade de aprender a tocar também. Tenho essa sensação toda vez que vejo a Stephani tocar.
Logo mais vou acabar comprando um baixo também já que esse show me deixou animada pra caramba de sair por aí tocando e respirando música.
Land of Talk
Elizabeth Powell é uma pessoa não-binária. Ser uma pessoa não-binária significa que essa pessoa não se identifica por esse sistema pelo qual a sociedade divide as pessoas em 2 gêneros: homem e mulher, como masculino e feminino, e determina seus papéis sociais.
“Algumas pessoas não-binárias podem sentir que seu gênero está “em algum lugar entre homem e mulher”, segundo a GLAAD, ou até podem definir seu gênero de maneira totalmente diferente — e distante — destes dois polos. Não é, necessariamente, sinônimo de transgênero ou transexual. Uma pessoa não-binária também pode se apresentar como “genderqueer” ou afirmar que tem identidade de gênero “não-conformista”.”
E eu não fazia ideia de que Powell se identificava como não binária, descobri durante o show. Eu gosto muito de Land of Talk, realmente nunca acompanhei muitas entrevistas sobre a banda, mas para fazer essa matéria dei uma pesquisada e não achei quase nada falando sobre a não-binaridade de Elizabeth. Vi várias matérias gringas usando os pronomes “she/her”, e talvez esse seja o pronome pela qual ela goste de ser chamada, realmente não posso afirmar porque não achei mais sobre.
Mas algo ainda tão importante quanto pronomes e ser reconhecida como pessoa não binária, é se sentir confortável em estar em algum lugar, se sentir segura e bem, como Powell disse que se sentia.
Querendo ou não, o debate de questões como feminismo, gênero, orientação sexual, orientação romântica, visibilidade e outros mais, são muito recentes. Começamos a falar disso de uns tempos pra cá. Começamos a perceber essas questões no nosso dia a dia recentemente.
Nem sabemos como, mas por muitas vezes essas questões eram varridas para baixo do tapete. Faz parte agora da tarefa de todos nós começarmos a debater mais sobre essas questões, procurar entender mais assim como eu estou procurando. Eu que não sei muito, pergunto para quem sabe mais e pode me mostrar como é.
Representatividade é importante. Não é apenas discurso. É necessário nos vermos na sociedade, é necessário ocuparmos espaços cada vez mais diversos. É preciso mostrar as diversas facetas do que é ser e viver. As pessoas precisam mostrar quem são, de quem gostam, precisam ser aceitas, respeitadas e amadas. Só assim conseguiremos viver livres.
Amo Elizabeth Powell, musicista incrível, uma voz poderosíssima e reconfortante, certamente é uma das minhas inspirações tanto pela sua presença de palco quanto pelo talento musical, pela força com a qual se entrega em seus shows.
Não precisa performar feminilidade no palco, não precisa vestir roupa X ou Y, cantar sobre isso ou aquilo. Desde o primeiro Balaclava Fest conseguiu me encantar e me emocionar. Sei que em qualquer show do Land of Talk que eu for, terei uma ótima experiência.
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