Alcest: transcendental e emocional em Spiritual Instinct

A espera foi longa, vivemos esse 2019 nos arrastando a espera do novo álbum. Esse não tem sido um ano fácil para nós, temos sido derrotados pelo capitalismo todos os dias. Mas tem algo que não pode ser tirado de nós é o amor pela arte. E Alcest é uma das coisas mais belas que a arte nos trouxe.

Taty:

Eu não consigo falar sobre essa banda sem me deixar levar pelas emoções e eu já sou muito emocionada sempre, então imagine… Sou fã incondicional, então espere muito amor sendo descrito nesse texto.

Além de ser a minha banda preferida da vida, é uma parte de quem eu sou. Uma boa parte de todo o amor que há em mim é destinado ao Neige (eu diria uma enorme parte pra ser sincera). Alcest não é apenas música, é espiritualidade, é um espetáculo a parte. Antes de começar a gostar de shoegaze, eu gostei de Alcest e antes de começar a gostar de Alcest, eu gostava de música celta.

Meus queridos franceses do blackgaze falam comigo profundamente assim como a música celta falava. Conseguem atingir aquele pontinho sensível do meu coração, acertam em cheio na minha alma, transmitem a mensagem e trazem um senso de compreensão inimaginável. Eu vou ser eternamente grata por ter tido a oportunidade de viver na mesma época que o Neige. Só por isso eu já me sinto sortuda demais. Às vezes eu acho que nem ser humano ele é, deve ser algum tipo de divindade.

E essa divindade criou um álbum espetacular, melhor do que qualquer coisa que eu poderia ter imaginado. Talvez seja um pouco cedo pra dizer, mas provavelmente vai se tornar meu segundo álbum preferido. Não poderia se tornar meu álbum preferido, pois nada supera o Écailles de Lune (2010).

E é incrível como Alcest fala de um mundo particular e espiritual de uma pessoa, são experiências pessoais e que não fazem parte do nosso cotidiano, mas que conseguem nos tocar e nos levar a algum lugar extremamente bonito e agradável. Aliás que se o cotidiano fosse bonito desse jeito, nós não precisaríamos sonhar e não iríamos querer escapar dele.

spiritual instinct – Class of Sounds

Spiritual Instinct foi composto depois a turnê do Kodama (2016), uma turnê longa e cansativa. Durante esse tempo, os tempos foram um pouco escuros para o Neige, o disco não é algo otimista e alegre como Shelter (2014). É um disco forte, catártico, exuberante, turbulento, melancólico e tudo isso sem perder todos os elementos originais que nos fizeram amar a banda.

Ainda é etéreo, cheio de referências a cultura pop, cheio de influência do shoegaze e post punk. Nesse álbum fica ainda mais claro toda essa dualidade que é essa questão da espiritualidade/religiosidade. Não exatamente falando de deus, mas sim de que há algo maior que alguns de nós acreditamos. Uma batalha interna, um tanto de existencialismo em forma de música, me fez pensar bastante.

Esse episódio do Metal Talks me trouxe muitas lágrimas e uma enorme compreensão do que esse disco significa. Vale a pena ouvir:

É difícil colocar em palavras nossos sentimentos. Por mais que a gente tente, às vezes parece que não chega exatamente no ponto que se quer alcançar. E ainda bem que a arte está aí para nos dar N maneiras para nos expressarmos, especialmente quando estamos sobrecarregados de emoções e pensamentos. Ao mesmo tempo que nos desliga de nossos problemas e nos leva a um mundo melhor.

Outra coisa que recomendo bastante é ver o mini documentário que nos trouxe as imagens maravilhosas presentes nesse post, o La lumière autant que l’ombre, o documentário sobre a gravação desse álbum. Cada frame é mágico e surreal de tão bonito:

Eu fiquei um tanto quanto arrepiada com a versão acústica de Protection que toca nesse álbum. Aliás, acho que vocês puderam perceber o quão arrepiada eu fiquei com tudo em relação a esse lançamento. A banda tem esse poder em mim, de me deixar impactada e maravilhada com a identidade visual, os videoclipes, os ensaios fotográficos, as entrevistas e tudo mais.

Pode ser que eu fique boba facilmente ou porque realmente tudo é realmente perfeito e caprichado, pensado milimetricamente para se tornar um espetáculo. Imagino o quão surreal será esse show e desde já vou começar a implorar para que o meu produtor preferido traga a turnê da minha banda mais do que amada para o Brasil.

ALCEST - discuss the songwriting! - Nuclear Blast

Fábio:

O Alcest é uma das únicas bandas dentro do metal que fazem música de forma totalmente sincera e emocional, esse foi o aspecto que mais me chamou atenção e fez com que eu criasse essa conexão, aquelas melodias e momentos de nostalgia me davam calafrios e me tiravam desse mundinho chato pra um outro universo paralelo, bonito, agradável e que servia de consolo pros pensamentos, que às vezes vinham de uma só vez pra me derrubar.

Se o disco anterior, Kodama, não havia me cativado, afinal senti falta de melodias mais sensíveis, e até cheguei a pensar que Neige estava tentando agradar os fãs metaleiros mais chatos com esse negócio de gutural, guitarra mais ríspidas e etc. Em Spiritual Instinct, as minhas esperanças foram renovadas, começando por apresentar somente seis músicas, pra mim, menos é mais, senti saudade desse formato que começou com os primeiros álbuns.

Alcest's Evolve on First 'Spiritual Instinct' Song 'Protection'

A primeira faixa ”Les jardins de minuit” tem a alma do Alcest e também traz um frescor, os elementos que os fizeram ganhar atenção de muitas pessoas, aquela união do metal com algo mais celestial, misturando de forma genial os guturais, blast beats, riffs rápidos e sonoridades mais atmosféricas e tocantes, tudo muito bem composto e que nos faz voltar há alguns anos atrás, em discos como Écailles de Lune (2010) e Les voyages de l’âme (2012).

“Protection” e “Sapphire” são músicas boas, e com resquícios passados que talvez sintetizem a transição do disco anterior até essa nova proposta, acredito que foram escolhidas como single pois são as mais ”comerciais”, inclusive, ganharam vídeo clipes.

Em ”L’île des morts” somos agraciados por um instrumental que se divide em duas atmosferas, acredito ser difícil deveras, unir o metal a melodias mais emocionais, uma vez que suas letras falam sobre espiritualidade, nostalgia e sentimentos tão profundos. Pois aqui temos essa mediação, dos momentos de ”caos” que aos poucos dão espaço a calmaria e seus instantes mais comoventes.

O ápice chega com ”Le miroir”,  uma música transcendental, nostálgica, emocional e cinematográfica, logo na primeira audição me trouxe na cabeça cenas de um anime japonês, é inevitável que faria bonito como trilha sonora de algum filme de Miyazaki, lembra sobre as melodias sensíveis? Sim, é isso o que eu esperava do Alcest, e eles fizeram!

ALCEST Release Music Video For First Single 'Protection' | Metal ...

Todos os discos do Alcest são uma jornada musical, você pode facilmente projetar imagens a cada momento, a faixa titulo ”Spiritual Instinct” consegue transmitir um apanhado de referências da carreira, sua aura é bem ”ending theme”, densa, carregada de emoção.

Neige é um humano sensível, que se entrega e se preocupa com o resultado de suas composições, afinal, ele é o criador da trilha sonora de sua vida e suas experiências pessoais, existe um grande apreço pela parte visual e sonora, e isso tudo faz com que ele seja um dos músicos mais criativos dentro do estilo.